domingo, 15 de novembro de 2015

Lenta e gradual

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 15/11/2015

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), manobra para evitar a perda do próprio mandato, ao negociar com o Palácio do Planalto. A oposição caiu na armadilha de uma aliança espúria


No seminário que provocou a demissão do chefe do Comando Militar do Sul, general Antônio Hamilton Martins Mourão, em Porto Alegre, na sede da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul, os empresários gaúchos debateram quatro cenários para desdobramento da crise ética, política e econômica do país: a renúncia da presidente Dilma Rousseff, a aprovação de seu impeachment pelo Congresso, uma intervenção militar e o prolongamento da crise até as eleições de 2018.

O presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), Heitor Müller, resumiu assim a conclusão a que chegaram: a renúncia não condiz com o perfil da presidente Dilma, a intervenção militar está descartada pelos militares e o impeachment não sai porque o PMDB e o PSDB não se entendem; “vamos ter que aturar essa crise até as eleições de 2018”.

As conclusões dos empresários gaúchos são as mesmas do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski. Numa palestra para estudantes de Direito em São Paulo, disse que o país precisa ter “paciência”. Referia-se, naturalmente, ao impeachment da presidente Dilma, que é uma prerrogativa do Congresso. “Com toda a franqueza, devemos esperar mais um ano para as eleições municipais. Ganhe quem ganhe as eleições de 2016, nós teremos uma nova distribuição de poder. Temos de ter a paciência de aguentar mais três anos sem nenhum golpe institucional”, disse.

Segundo Lewandowski, esses três anos “poderiam cobrar o preço de uma volta ao passado tenebroso de trinta anos”. Arrematou. “Devemos ir devagar com o andor, no sentido de que as instituições estão reagindo bem e não se deixando contaminar por essa cortina de fumaça que está sendo lançada nos olhos de muitos brasileiros.”

Lava-Jato

No mesmo dia, o juiz federal Sérgio Moro decretou a quebra do sigilo telefônico do PT e de pelo menos seis números que seriam usados pelo ex-tesoureiro do partido João Vaccari Neto, preso desde março, em Curitiba, acusado de ser operador de propinas no esquema de corrupção na Petrobras. A abertura de dados alcança o período de 2010 a 2014, ou seja, três campanhas eleitorais. A força-tarefa da Operação Lava-Jato aponta o uso da legenda como forma de ocultar dinheiro desviado da estatal por meio de contribuições e de doações de campanha. O Ministério Público Federal acusa Vaccari de usar uma gráfica ligad a ao partido para supostamente lavar dinheiro da Petrobras.

A propina do esquema da Petrobras teria sido canalizada para a Editora Gráfica Atitude por meio de repasses do executivo Augusto Ribeiro Mendonça – do grupo Setal – um dos delatores da operação. Ele revelou que o ex-tesoureiro lhe pediu R$ 2 milhões para o partido e sugeriu que o depósito fosse feito em favor da gráfica. “Os sócios da Editora são o Sindicato dos Empregados de Estabelecimentos Bancários de São Paulo/SP e o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, de notória vinculação ao Partido dos Trabalhadores, sendo que Juvandia Moreira Leite, presidente do primeiro Sindicato, figura como administradora da Editora”, afirmam os procuradores.

As ações de Moro parecem dar razão à afirmação de que as instituições funcionam. Nos tribunais superiores, tramitam ações contra a presidente Dilma Rousseff e o vice-presidente Michel Temer (Tribunal Superior Eleitoral), governadores (Superior Tribunal de Justiça) e ministros, deputados e senadores (Supremo Tribunal Federal). Pode ser que sejam julgadas antes de 2018. A Operação Lava-Jato agora avança em direção ao PT, partido que pode sofrer graves sanções.

A crise, pois, segue lenta e gradual. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mata no peito as denúncias contra ele e manobra para evitar a perda do próprio mandato, ao negociar com o Palácio do Planalto o arquivamento dos pedidos de impeachment da presidente Dilma. A oposição perdeu o bonde: caiu na armadilha de uma aliança espúria com Cunha.

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