quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Em marcha forçada

Dilma opera com o Orçamento da União, os bancos oficiais,
os fundos de pensão e as agências reguladoras,
numa espécie de novo “dirigismo estatal”


Por Luiz Carlos Azedo
O Brasil, tecnicamente, entrou em recessão. Ilha
de tranquilidade num mar proceloso, o nosso
ciclo de desaceleração está em curso desde dezembro
passado, no rastro da crise nas 30 nações
mais ricas do mundo. Talvez por isso, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva tenha resolvido antecipar a
disputa sucessória. Numa espécie de marcha forçada,
colocou na estrada a candidatura da “mãe do PAC”, a ministra-
chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), gerente
do “Programa de Aceleração do Crescimento”. Se o Brasil
conseguir sair da recessão antes das eleições de 2010,
Dilma poderia virar uma espécie de Fernando Henrique
Cardoso de saias, isto é, se eleger presidenta da República
de forma semelhante ao tucano, que chegou ao Palácio
do Planalto, em 1995, graças ao Plano Real.
Recessão
Nesta semana, a Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico (OCDE) diagnosticou a
desaceleração da economia brasileira. O presidente
Luiz Inácio Lula da Silva enfrenta a recessão de duas
maneiras. No plano objetivo, adota medidas fiscais e
monetárias para garantir o crédito e a produção, estimula
o consumo das famílias e amplia o gasto público.
No subjetivo, diz que o novo presidente dos Estados
Unidos, Barack Obama, está com um “pepinaço” nas
mãos e estamos pagando pelos erros dos norte-americanos.
Ou seja, se a crise chegar aqui pra valer o fracasso
será de Obama.
A estratégia de Lula é eficiente do ponto de vista eleitoral.
Dos 35 países avaliados pela OCDE, o Brasil é o único
que não está em “forte desaceleração”. Ou seja, a “marolinha”
virou “calhau”, mas não deu um “caldo” no governo.
Porém, não sabemos ainda se a crise chegou mais
branda por aqui ou está vindo atrasada. Os próximos
meses é que dirão. Na primeira hipótese, as chances de o
governo Lula sair altaneiro da crise em 2010 são reais; na
segunda, a sucessão presidencial ocorreria em plena recessão,
com o governo desgastado.Nos países industrializados
e emergentes,a desaceleração foi de 8,2 pontos em 12 meses, chegando
a 92,9 pontos.Na zona do euro, a queda foi de 8,2 pontos
em relação a 2007,com 93,8 pontos. Nos Estados Unidos, o recuo
foi de 9,5 em um ano, com total de 91,3 pontos. O Japão caiu
para 92,2 em dezembro,uma queda de 7,3 pontos em relação
ao ano passado. O Brasil ficou abaixo de cem pontos
pela primeira vez em cinco anos. Em dezembro, ficou em
98,8 pontos, uma perda de 5,4 pontos no ano, a melhor situação
entre os BRICs: China recuou 14 pontos no ano,
total de 87,6 pontos; Índia, 7,5 pontos, soma de 94,4 pontos;
e Rússia queda de 17,7, total de 86,7 pontos. Para a
OCDE, nota inferior a 100 significa recessão.
Sucessão
O presidente Lula, cuja popularidade cresceu ainda mais
com a crise, conseguiu a proeza de transformar a ministra
Dilma Rousseff na candidata natural do PT dois anos antes
da eleição. Agora, tece alianças para que seja a monopção
das forças que apoiam o seu governo. Essa aglutinação,
inicialmente, não se dá por meio dos partidos políticos.
É construída a partir das relações do governo Lula
com os movimentos sociais e os agentes econômicos. Dilma
ocupa a segunda posição no vértice do sistema de poder,
abaixo da presidente da República, mas acima de todos
os demais ministros. Não há demanda social expressiva
ou grande negócio no país que não dependa do aval
“técnico” da ministra.
Graças ao marketing político, que dita o gestual, a retórica
e o visual de Dilma, a ministra subiu nas pesquisas
e acumula forças para conquistar a adesão maciça
do PMDB, hoje muito bem plantado na Esplanada dos
Ministérios. Há que se considerar, para isso, o papel dela
na execução da política “anticíclica” do governo Lula.
Dilma opera com o Orçamento da União, os bancos oficiais,
os fundos de pensão e as agências reguladoras,
numa espécie de novo “dirigismo estatal”, sem precedentes
desde o governo Geisel. A crise econômica fortaleceu
no governo os setores que veem no “capitalismo
de Estado” uma alternativa para o desenvolvimento
econômico e as mudanças sociais, ainda que o “ciclo de
substituição de importações”, que fomentou essa concepção
entre os militares e na esquerda brasileira, tenha
sido ultrapassado pela integração do Brasil à economia
mundial na década de 1990. Dilma defende e encarna
esse projeto no governo.

Publicano na coluna Nas Entrelinhas do Correio Braziliense em 08 de fevereiro de 2009

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